quinta-feira, novembro 27, 2003

Sábado, 22/11/2003

Um dia inesquecível

Por que inesquecível?

Como vcs sabem façi Direito, estou no terceiro ano. O que tem a ver com o meu dia inesquecível? TUDO, pois fui visitar um Presídio neste dia, isso mesmo fui ao presídio com a turma para conhecer como as coisas realmente são por lá.
Fomos ao PCE, Penitenciária Central do Estado.
O que achei?
A coisa mais deprimente e degradante de que já havia visto.
Chegamos lá por volta de meio-dia. Entrei no local lá por umas 12:30. Claro que grudei no meu amigo Ricardo, não saí do lado dele por um segundo sequer, ou melhor, saí, quando tivemos que subir uma escadinha bem estreita, mas foi só nesse momento.
Inicialemente fomos a uma sala da parte administrativa onde um agente penitenciário nos esperava para mostrar-nos algumas coisas. O quê?
As últimas coisas apreendidas na última revista das celas.
O que foi encontrado?
Facões, canivetes, celulares, cordas para fuga, drogas como maconha, craque, baralho que eles fazem, isso mesmo, os presos fazem com papelão e caneta, foi apreendido pois jogo instiga briga e confusão. Jogo do bicho que fizeram num pedaço de pano e alguns dadinhos feito com papelão. Ah, e uma coisa muito nojenta, a chamada CHOCA.
A choca é uma mistura de restos de comida e cascas de frutas que eles colocam dentro de uma garrafa e colocam água e a dixam por um tempo "chocando" tudo aquilo, até que depois de vários dias tudo aquilo fermenta e vira álcool, isso mesmo, álcool, o cheiro é nojento, não tive coragem de cheirar, mas meu amigo disse que é uma mistura de álcool com vômito. Nojento...
Depois adentramos ao local. Passamos a ala administrativa, atravessamos uma área que parece um jardim que separa a parte da administração e chegamos aos pavilhões.
O local é escuro, feio, úmido, com cheiro ruim.
Seguimos por um corredor que atravessa os pavilhões, esse corredor era de grade, tínhamos visões às celas, tanto a frente, como atrás delas. AH! os presos também tinham visão de nós passando por aquele corredor.
Estava eu, olhando para o nada por uns instantes e quando olho fixo meu olhar me depara com um dos presos me olhando fixamente, me deu um arrepio do pé a cabeça. Fui olhar para o outro lado e outro preso me olhano nos olhos.
Abracei meu amigo e pedi para continuarmos andando.
Eu estava muito nervosa, com uma angústia dentro de mim. O Ricardo as vezes dava risada e dizia, calma Mi, calma, não vai acontecer nada... Mas aquela sensação ruim dentro de mim não passava.
Continuamos a andar, atravessamos alguns pavilhões e chegamos numa escada, descemos, chegamos ao lugar do castigo. O local é muito mais escuro que os demais blocos, é mais úmido. Lá ficam os presos que fazem algo errado, os que estupram, isso mesmo, eles se estupram tudo bem que todo mundo sabe que isso acontece, mas vê-los... os que tentam suicídio, e os jurados de morte.
Ah, detalhe. Nesse momento umas putinhas, umas meminas que ao invés de irem de calça comprida, camiseta e casaco para não chamar a atenção, resolveram ir de vestidinho de praia, calça baixa, top, umbigo de fora, algumas mostrando piercing, pra mim mulher que vai pra um lugar desse pra se mostrar só pode ser puta.
Então, quando estávamos no bloco das celas de castigo, essas putinhas foram bem na frente, pra ficarem bem a vista dos presos, o resultado?
Uma gritaria, uma batessão (não sei se escreve assim) nas portas das celas, aí me deu um cag... daqueles, meu amigo me abraçou e pedi pra sair dali. O professor só quis matá-las por isso, mas tudo bem.
Quando estávamos saindo de lá, uma porta bateu muito forte, a Rúbia perguntou o que estava acontecendo e o agente penitenciário disse para não olhármos para trás e irmos andando, ela insistiu em perguntar o que estava acontecendo e ele disse que era a hora da revista dos presos que haviam recebido visitas.
Como é essa revista? Todos eles tiram a roupa, toda a roupa, e levam o jato d'água, que tem muita pressão, ficam de cócaras e abrem o c.. para que o carcerário possa ver se não colocaram nada. Depois molham toda a cela com o jato para depois olharem o que tem dentro, se não levaram nada para lá.
Voltando ao "passeio", depois fomos ao local de visita íntima, são uns quartinhos que devem ter 2X2m, a maioria sem colchão, sem nada...
Ah, detalhe da plaquinha na entrada: "Use e abuse, mas não lambuse".
UIIII, muito nojento, não quis nem botar meu pé lá dentro.
Demos mais uma volta e saímos.

O que aprendi com tudo isso?
Que nenhum preso sai de lá recuperado para integrar a sociedade. O lugar é horrível, degradante, o espaço é mal aproveitado, eles ficam todos socados dentro das celas, que na tese seria 1 por cada, e na verdade tem 4 a 5 por cada.
Trabalho de recuperação? Há uma "fábrica" de shampoo e detergente, e de bolas que são exportadas, também fazem bolas para cegos, umas que tem sininhos dentro para fazer barulho. Todos os presos frequentam essa fábrica, não, não, só os mais comportados.
Primeiro que o espaço é mal aproveitado, segundo que não há pessoas sufucientes para cuidar de tudo aquilo. São 1.500 presos para 20 agentes que fazem escalas 10 por 12h e mais 10 por mais 12h. Quantos militares? 25, isso mesmo, 1.500 presos para 25 militares, é um absurdo...

Depois fiquei sabendo de algumas histórias do pessoal que ficou conversando com as mães dos presos. Cada uma que Deus o livre. Uma delas é que uma mulher contou que sua nora nunca mais foi visitar o marido porque o carcerário na hora da revista a estuprou. Outra contou que o filho é aidédico e que não há assistência médica lá dentro desde a última rebelião, há uns 06 meses. Outra contou que um dia um carcerário ligou dizendo que seu filho estava com hemorragia no ouvido, que saia muito sangue pelo ouvido dele e que era para ela ligar para a Corregedoria do Estado para tomarem providências pq ninguém chamou um médico. Fora outras que não quero comentar...

Não pensem que tenho pena deles, sempre disse, se estão lá é pq fizeram por merecer. Mas o que me revolta é saber que nunca ninguém sairá recuperado de lá, que com certeza muitos deles serão reicidentes, se não vários já não são... Mas a condição de sobrevida deles é lastimável, não digo que tivessem que viver no bem-bom, mas que aproveitassem eles e realmente os reabilitasse, botassem eles para trabalhar, que tivesse muito mais policiais e agentes para cuidar de tudo aquilo.

O que mais eu aprendi?
Que o Direito Penal é muito bonito, na Teoria...



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